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sábado, 4 de dezembro de 2010

O MONSTRO DE CADA UM

 


O carrossel multicor contrastava no ambiente ocre acinzentado daquela pequena cidade. A velocidade de um furacão redemoinhava as fitas brilhantes e coloridas que ornavam o lúdico brinquedo em ação e aqueles movimentos e entusiasmo de tudo o que aos olhos fascinavam trazia cada vez mais a certeza que aquele momento era surreal, que ele não fazia parte daquela cidade do interior. O mundo inteiro não cabia de tanta felicidade naquela sinfonia de alegria e prazer entre horizontais e verticais, cadeiras, rodas e cavalinhos, gritos, risadas e movimentos. Girava o mundo e o meu coração.
O olhar inocente e doce viajava entre imagens encantadoras e lágrimas, onde a cada uma que aleatoriamente escorria no pequeno rosto iluminado pelas luzes que ornavam aquele mundo mágico cravavam a certeza de que tudo aquilo não era seu, que todo aquele universo eram para os escolhidos em um sorteio invisível. As mãozinhas fixas e fortemente atracadas nos varões de ferro que separava essas duas realidades limitavam os sonhos, desejos e anseios daquela criança de calção surrado e pés no chão.
E o monstro da luz de fogo com o seu poder de bruxo do cifrão faz o pequeno coração sentir o peso da perda que brutalmente soca o seu peito lhe fazendo chorar sem realmente saber o que significava toda aquela transformação. Viu alguns de seus amigos da rua onde morava enfrentando aqueles monstros em giros alucinantes e sempre vitoriosos desciam com cara de satisfação na certeza de novas batalhas e vitorias. Como uma fração de segundos a mente fresca e infantil abre um leque de lembranças recheadas de quintais, fruteiras, balanços de pau e corda, gangorras na raiz de um antigo cajueiro e do escorrego nas folhas de um coqueiro anão. O cheiro da comida caseira e das marmeladas feitas no quintal da velha Lindinha e a sua turma a correr e brincar despreocupadamente naquelas lembranças. Em suas recordações ele não estava só, mas com todos os seus amigos que naquele momento lutavam animadamente com os monstros do prazer no outro lado, tão perto, mas tão distante.
-Porque eu não posso?
Um forte soluço lhe tomou o corpo e quase sem controle ele se viu tão pequeno, sem poder, sem liberdade. Era o invisível mostro da vida de cada um ser humano se apresentando ao pequeno que acabara de nascer para a realidade.
Juscio Marcelino de Oliveira