A PORTA
Indignado o homem de meia idade reordenava o colarinho da camisa de linho verde desbotada, como se fosse um touro prestes a atacar; em expressão e trejeitos, corpo inquieto, lábios trémulos e olhos lacrimejantes. Aquele corpo prestes a explodir pedia solução.
-Era um homem bomba?
Aquela noite fria e lúgubre era a atmosfera perfeita para o inesperado acontecer, era o cenário do dia D da vida daquele pobre e indefeso mortal.
-Caramba! Até parece roteiro para Zé do Caixão. Muito sinistro.
Lacrimejava a emoção ferozmente contida na escura estribaria daquele bruto corpo. Preso em um invisível espaço surreal, nas amarras da formação sócio familiar. Que destino esperava na fração dos minutos contidos...
-Pára! Que história complicada!
Daquele homem que caminhava no escuro da vida em direção do abismo do ceio familiar...
-Pára, eu já falei!
-Muito chato o que você fala e é cheio de complicação. O senhor não ia falar do homem que ia dizer aos pais que era gay, ou não?
Abre a porta que inerte está ao seu tenebroso conflito, com as mãos tremulas e molhadas pelo suor do nervosismo e espremidas em gotas que escoem naquela fria e metálica maçaneta de bronze envelhecida, o homem suspira forte pedindo socorro aos céus.
-Eu não digo que o senhor só complica com essa conversa comprida. Até parece um escritor. meu Deus, é uma coisa tão simples de dizer, mas não, ele faz bicos e rendas para dizer aos pais que é gay.
Relutante ao que iria revelar para aqueles que tanto o admirava como um homem integro e honesto, que estava buscando segurança financeira para poder constituir uma família; esposa, filhos. A continuidade daquela geração pairava como uma nuvem chuvosa sobre aquele calvo homem.
-Tá vendo como ele é complicado; falou pelas tabelas e da porta não saiu. esses anos todo de vida para se decidir e quando vai falar, fica nesse chove não molha. Pra mim chega!
Você fala assim porque não sabe como é complicado se aceitar e principalmente assumir para os pais. Sou filho único e mesmo que tivesse mais filhos, sei que vai ser a morte pra eles.
-Morre um, mas nasce outro, bem melhor, bem resolvido, feliz com ele mesmo. Não complique. Se os seus pais o amam tanto assim como você acha, então eles vão de início ficar tristes, mas rapidinho irão te abençoar e te amar da mesma maneira, quem sabe amarão até mais. Entra besta, abre essa sua porta e se liberta dessa agonia.
Pingos latejantes escorriam no rosto gelado...
-Entra ou não entra, mas ficar nesse lenga lenga você não vai ficar mesmo. Veja, a porta se abriu, e é a sua mãe. Vamos, coragem. Respira fundo e fale!
Mãe, já faz muito tempo que...
-Seja objetivo. Fale!
Mãe, eu sou...